Meditávamos na formação passada como Deus quis se revelar a nós. Ele providenciou tudo: deu-nos uma inteligência com uma inclinação natural à verdade e, por fim, veio Ele mesmo nos saciar com esta verdade que é Ele próprio: "Eu sou a Verdade".
O catecismo nos ensina que a finalidade da nossa vida é "conhecer, amar e servir a Deus". É pela fé que conhecemos a Deus. Portanto, sem a Fé, não poderíamos realizar o anseio profundo das nossas almas. Percebemos, então, que há um traço que permeia toda esta dinâmica da Fé: é a bondade de Deus, o seu amor perfeito que quis Se revelar e, portanto, permitir que O conhecêssemos e fôssemos felizes.
Este amor se expressa em absolutamente tudo quanto Deus faz. A simples existência das criaturas é manifestação deste amor. Em verdade, Deus é absolutamente feliz em Si mesmo. Ele não sente nenhuma necessidade de outras coisas. Se nos fez, não foi para que supríssemos uma necessidade ou um desejo Seu de ser louvado. O desejo indica falta. Nós desejamos o que nos falta. Porém, em Deus não há nenhum tipo de falta. Ele é plenamente completo. Acontece que Deus quis nos criar. Mas, se Ele não precisa de nós, para que nos criou? Simplesmente para nos comunicar a Sua felicidade.
No entanto, o homem traiu a Deus; respondeu à infinita bondade divina com a baixeza do próprio egoísmo. Por causa disso, ele foi excluído daquele estado de felicidade, somente possível na amizade divina. O homem se viu frustrado; estava impedido da plena alegria para a qual fora criado, e tudo isto porque, tendo sido feito para o Amor, ele tinha negado este amor com o seu egoísmo. Porém, Deus não desiste do homem e realiza algo soberanamente único. Diz-nos o Apóstolo João:
"De tal forma Deus amou o mundo que deu o Seu único Filho para que o mundo seja salvo". Vamos percebendo que toda e qualquer ação divina tem seu fundamento no amor. Se nós somos produtos deste amor, isto significa que o amor é a nossa natureza mais profunda. Nós nos realizamos e nos tornamos felizes quando aprendemos a amar ao modo divino. Frustramos a nossa felicidade quando, ao contrário, recaímos no egoísmo.
É porque Deus nos amou que podemos amá-Lo de volta. É o que diz o Apóstolo: "Deus nos amou primeiro". O nosso amor a Deus é, portanto, resposta. É como se Deus nos tivesse pedido em namoro, e espera a nossa aceitação ou a nossa recusa. E aqui está outro traço inerente ao amor: a liberdade. Deus nos amou de tal modo que nos fez livres; Ele respeita profundamente a nossa decisão: se O quisermos, seremos felizes. Mas podemos não querê-Lo, embora isto ponha a nossa alma na escuridão. Deus, no entanto, respeita a nossa decisão, qualquer que ela seja.
Se a nossa natureza tem sua felicidade no amor, importa que saibamos exatamente o que significa amar. Nós vivemos numa sociedade que fala de amor continuamente. Porém, será que ela sabe o que isto significa? Será legítimo o amor que tantas vezes vemos nas novelas, nos filmes, etc? Será que é amor o que certos adolescentes irresponsáveis vivem em certas festas ou em salas escondidas nas escolas? Não. Nós podemos chamar de "amor" exatamente aquilo que ele não é. Isto pode causar confusão. E, lembremos, se não aprendemos a amar, simplesmente não nos tornamos pessoas felizes. Amar é uma exigência da nossa natureza e é no que consiste a nossa relação com Deus.
Existem basicamente três tipos de amor: O Ágape, o Eros e o Filos.
Comecemos do primeiro: o Ágape. Deus é perfeito Ágape; o que caracteriza este amor é a plena doação e gratuidade. Por plena doação, queremos falar daquela disposição contínua de dar a Si mesmo. Se observarmos bem, a história da Salvação é a história de um Deus que continuamente se dá para conquistar seus filhos. Estes, embora absolutamente necessitados de Deus, costumam recusar esta amizade. No entanto, Deus simplesmente se dá. Cristo chegou ao extremo de "despojar-se de Sua igualdade com Deus e rebaixar-se à nossa condição". Ele continuamente se deu até a morte de Cruz. S. João, testemunha próxima de Jesus, nos diz que Ele nos amou ao extremo, meio que com excesso. O Ágape é todo doação e não se coloca limites. É como uma torrente violenta de água a derramar-se; é como uma cascata imensa e sem fim.
Quando falamos de gratuidade, queremos dizer que o Ágape ama sem esperar nada em troca. Não é interessereiro; não precisa de um motivo para amar. Nas nossas relações diárias, geralmente agimos com interesse. Gostamos de sentar perto de uma pessoa bonita, ou fazer amizade com alguém que tenha uma certa condição financeira. Convidamos pessoas importantes para a nossa festa, às vezes pensando que isto fará com que sejamos convidados depois. Fazemos certos favores esperando um retorno. Baseamos a nossa amizade no nível de prazer que podemos ter com a outra pessoa. Tudo isto é mais egoísmo que amor. Deus não é assim. Se fosse, Ele não nos amaria, pois não temos absolutamente nada para oferecermos a Ele e nada há de que Ele precise. O Ágape, portanto, simplesmente ama. Sta Teresinha de Lisieux dizia que "assim como a rosa, por ser rosa, perfuma, assim o amor, por ser amor, ama". Compreendendo essas características do amor Ágape, passamos a entender Deus de um modo um pouco melhor.
Falemos, então, do amor Eros. Este tipo de amor, do qual se originará o termo "erótico" é, ele também, um modo legítimo de amar, desde que esteja ordenado ao Ágape. Este Ágape é a fonte de todo e qualquer verdadeiro amor. Portanto, qualquer afeição que contrarie o Ágape, distancia-se do amor. O eros é aquele amor que sentimos por uma pessoa do sexo oposto e que nos inclina a amá-la de um modo exclusivo. Ele está na base do namoro e do matrimônio. O eros, portanto, envolve, além do mero afeto, um aspecto da sensibilidade que incorpora, também, o corpo. Não quer dizer que eros seja mera atração física. Este tipo de atração podemos sentir por umas cinquenta pessoas só num mesmo dia, rs. Não é isso o amor eros.
É importante especificar a sua relação com o Ágape, pois o eros, se se torna totalmente autônomo, tende a se desvirtuar. Como ele se inclina à união de dois indivíduos, quando afastado do Ágape, esta união pode se tornar um modo de egoísmo. É isto o que acontece com a "erotização" atual da sociedade. O "amor" é entendido como uma "relação genitalizada". Este tipo de experiência, não apenas se distancia do legítimo amor, como também o impede. E, se não vivemos o amor - é importante lembrar - não somos felizes. Uma sociedade, portanto, totalmente sexuada tende a ser uma sociedade angustiada. Para termos a prova, é só observar ao redor.
Quando, no entanto, o eros é vivido na sua ordenação ao ágape, ele se torna uma porta para o crescimento, para a felicidade, para a transcendência. O eros, deixado só, torna-se irresponsável. Imerso no ágape, no entanto, favorece a disciplina e a vitória contra o próprio egoísmo. Repetimos: é este amor que permite a união dos esposos e a constituição das famílias.
Por fim, temos o amor filos, que é o amor entre amigos ou irmãos. É o amor de amizade que devemos devotar aos nossos próximos. Ele não é exclusivo como o eros; no entanto, o tipo de união que favorece é, naturalmente, mais limitado que aquele. Fundado também no ágape, este amor nos ajudará a amar sem interesse os nossos amigos, a querer-lhes sinceramente o bem sem esperar nada em troca. É assim que se ama. Para realizarmos a nossa natureza, importa amar do jeito certo. Se apenas disfarçamos, isto é, fazemos de conta que amamos, caímos na hipocrisia que é um modo de zoação contra o amor. Os hipócritas são, na verdade, orgulhosos e egocêntricos.
Para que vivamos bem estes modos diversos de amor, é importante que tenhamos uma relação de proximidade com Deus, o puro Ágape, de onde descende todo legítimo amor. Se afastamos Deus da nossa vida, nem as nossas amizades nem os relacionamentos mais íntimos poderão garantir sua pureza. Só em Deus podemos ser bons. É o que diz Jesus: "Só Deus é bom". Sem Ele, portanto, não há bontade, isto é, não há amor.
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